Em 2022, a mpox — m de macaco, pox de pústula — causou quase 100.000 casos e mais de 200 mortes em 123 países, ao mesmo tempo em que ainda estávamos no acostumando à pandemia de Covid-19. Agora, essa doença causada por um certo habitante da Virosfera volta para nos assombrar, agora sob uma nova forma.
Já falamos sobre a mpox aqui, mas há novidades muito importantes que merecem uma volta ao tema.
A principal delas é que, em 14 de agosto, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou a mpox Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional, como já havia feito em 2023.
A base para a decisão foi o aumento de casos na República Democrática do Congo e seu espalhamento para nações africanas onde ela nunca tinha ocorrido, com mais de 15.000 infecções e 400 mortes naquela região, representando um crescimento de 160% nos registros desde o ano passado.
Isso é muito grave para países que não tem um sistema de saúde capaz de atender pacientes com os sintomas da doença. A saber, são eles: febre, dor de garganta, dor de cabeça, dores musculares, dor nas costas e pústulas por todo corpo, com destaque para a região genital, já que o vírus da mpox se transmite mesmo é por contato direto pele a pele, como nas relações sexuais.
Isso explica porque a letalidade do mpox é bem mais baixa na Europa, por exemplo, onde o paciente pode ser tratado, pois há um medicamento eficiente contra esse vírus.
+ Leia também: E se não fosse na África? Reflexões sobre mpox e equidade em saúde
Mas o que está acontecendo de diferente agora com a mpox?
Vamos aos fatos. Como mencionei, a doença se transmite muito bem pelo contato sexual, mas não pela troca de fluidos — como sêmen e sangue, caso do HIV —, mas sim pela proximidade da pele com pústulas de uma pessoa com a pele saudável de outra.
Então, muito do aumento dos casos se deve ao hospedeiro, ou seja, nós. Usar preservativos, por exemplo, pode diminuir o risco de contágio, mas as vesículas transmissoras do mpox podem estar espalhadas além das áreas protegidas pelos preservativos.
Outra variável importante, que conta para o aumento de casos na África, é o descaso de décadas com a doença na região, onde a falta de educação sanitária e de vacinas (sim, temos vacinas eficientes já há muito tempo contra o mpox), além do desinteresse de governos locais, deixaram o vírus se divertir à vontade.
Só em 2022, quando os casos começaram a ocorrer fora do continente, a coisa se tornou oficialmente importante. E o vírus causador da doença, o que andou fazendo nesse tempo?
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Um novo ramo na árvore genealógica do vírus
Um parente do vírus da varíola, doença erradicada há décadas, o relógio do mpox bate um pouco mais devagar do que o do coronavírus e do influenza, causador da gripe. Mesmo assim, o tique-taque molecular ao longo do tempo fez com que surgisse, mesmo antes do surto de 2022, dois grandes ramos ou clados (clado vem do grego klados que significa ramo), o clado I e o clado II — esse último envolvido na maioria dos casos de 2022-2023.
Nesse surto de agora, quem está envolvido é um vírus mpox de um ramo derivado do clado I, chamado de Ib. Ele tem várias mutações espalhadas no seu genoma. E membros do clado I são mais virulentos quando testados em camundongos de laboratório do que alguns do clado II.
As impressões digitais genômicas do mpox Ib mostram que ele já está andando entre pessoas na África por algum tempo, tendo vindo provavelmente de um hospedeiro silvestre, como um roedor, já que estes — e não os macacos — são os reservatórios naturais do mpox. As vacinas atuais devem funcionar contra a linhagem que circula agora.
Em resumo, a OMS está correta em declarar a emergência, e uma linhagem antes desconhecida (mas não necessariamente nova) de vpirus mpox vai se espalhar pelo mundo com grande sucesso. Mas ela não se tornará uma pandemia, porque a transmissão é lenta e temos tratamento e vacinas.
Claro, ajudaria muito se as autoridades de diversos países, o nosso incluso, acelerassem as compras de vacinas e medicamentos e investissem em produção local.
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